Curitiba, 19 de junho de 1988
MARIZA SOARES DE AZEVEDO, nasceu numa cidade pequenininha perto de Pernambuco, do Engenho, onde seus pais moravam. Veio para cá visitar o irmão e decidiu ficar entre nós. Mariza é uma mulher determinada, cumpridora de seus ideais. Presidente da Saza Lattes, secretária do Clube Soroptimista, executiva e esportiva. Confiram a garra e a alegria desta mulher aparentemente tão frágil, que tanto faz pela comunidade.
IZZA – Sabemos que você é uma mulher dinâmica, que desenvolve muitas atividades e que, consequentemente, sempre está em pauta. Conte-nos um pouco de sua vida agitada.
MARIZA – Realmente. Sou presidente da Saza Lattes, secretária do Clube Soroptimista Internacional (secretária é a segunda pessoa substituta da governadora), e nas horas de lazer me dedico à pesca nos finais de semana, algumas vezes para apenas treinar e outras para participar de campeonatos. Acho que nesse setor sou relativamente boa, porque no Campeonato Brasileiro de 1986, fui campeã brasileira da segunda etapa de Pesca e Lançamento do Brasil. Foi um título que o Paraná mantinha e eu o trouxe mais uma vez para o nosso estado. Meu marido também pesca, é solidário, participa e tem algumas medalhas e troféus paranaenses. Tenho também uma loja. Além de gostar de trabalhar, estou muito preocupada com o destino do nosso País.
Há vinte e dois anos tenho razão social individual. Fui precursora de discos, pois a primeira cadeia foi minha, a “Lá Maior”. Montei também lojas em São Paulo, Porto Alegre, Rio de Janeiro. Fizemos uma campanha de discos, certa vez, que teve repercussão internacional: “disco a quilo”. A partir daí, foram surgindo novidades no Brasil, mas acho que fomos nós que começamos a lançar essa ideia de venda de um artigo que não se compra a peso. Fomos até entrevistados por jornais de outros países. Foi uma campanha inédita no Brasil, e a partir daí eu me dediquei durante vinte e sete anos. Deixei por opção, com a finalidade de me voltar então às coisas que realmente gosto de fazer. Como já mencionei, sempre fui muito preocupada com o destino de nosso povo, em ajudar os carentes. Assim, iniciei meu trabalho voltado às comunidades, fazendo parte de clubes de serviço, como é o caso do Clube Soroptimista, e por indicação, fui convidada a participar da Saza Lattes numa época difícil para colaborar, assumir.
Já fui reeleita pela segunda vez consecutiva, conseguindo assim uma realização muito grande, restabelecer a credibilidade da Saza Lattes, em âmbito nacional e estadual, e já com repercussão internacional. O nosso trabalho tem tudo para chegar a ser modelo internacional, por- que conta com os padrões internacionais de saúde da OMS – Organização Mundial de Saúde. Tivemos a sorte da vitória para a indicação do ministro da saúde, Borges da Silveira, o qual muito preocupado com os destinos do povo menos favorecido, tem tido uma ótica muito voltada para o social, saúde comunitária e instituições não governamentais. Tem nos apoiados grandemente, dando muita credibilidade ao nosso trabalho e encaminhando verbas necessárias para utilizarmos aqui e a curto prazo. Os programas passaram a ser vistos de forma global e aplicados em outros Estados Brasileiros.
IZZA – Noto que ultimamente a Saza Lattes está bem comentada. Em que consiste?
MARIZA – E a APMI – Associação de Proteção à Maternidade e à Infância. Desde a hora em que constatamos a gravidez, nos responsabilizamos pela parturiente, orientando na higiene, na alimentação e no preparo. Fazemos completamente o acompanhamento pré-natal, da presença do feto até o nascimento, partindo para outro estágio: vacinação, saúde do bebê, orientação até a idade escolar. Temos ensino supletivo de primeiro e segundo graus e convênios com o MEC. Orientamos essas crianças, a família, promovendo socialmente, levando até trabalho para a mãe, para aumento da renda familiar. Ajudamos através de assistentes sociais que temos em cada posto, fazendo levantamento de nossas áreas e resolvendo o problema de base. Este é o nosso objetivo maior.
IZZA – Como é esse problema de base?
MARIZA – Não adianta recebermos uma criança desnutrida ou desidratada e a colocarmos de volta às condições sub-humanas em que vive. Fazemos primeiramente um levantamento naquela casa, naquele lar, vendo quantas pessoas têm disponibilidade de trabalhar e capacitamos a pessoa através de cursos profissionalizantes. Pegamos do início, porque quando a mãe não teve alimentação adequada, a criança nasce sem os neurônios necessários para o desenvolvimento motriz na época certa e, assim, a idade cronológica jamais vai coincidir com a mental.
Por isso, nós vamos já orientando a alimentação da mãe, incentivamos muito o aleitamento materno, porque é o fator que mais previne as doenças da primeira, infância. Ajudamos a mãe em todos os pontos de vista, fazendo a sua promoção social. Quantos depoimentos temos tido, emocionantes, de pessoas que eram faveladas e hoje trabalham em bons lugares, de nível, ganhando relativamente bem. Isso nos enche de satisfação. Muitas pessoas passaram pela Saza Lattes porque o nosso trabalho sempre foi tido como de primeiríssima qualidade.
IZZA – Parece que você se doa de corpo e alma a esse trabalho, não é?
MARIZA – Eu me dedico. Fui convidada para dirigi-la porque estava insolvente e com poucos dias de sobrevivência. Esse órgão, além da parte humana que administramos, tem que ser dirigido na parte empresarial, porque temos 203 funcionários. Além da força moral e do trabalho voluntário que captamos, porque acreditamos demais no voluntariado, temos constantemente adesões. Quatorze técnicos, entre eles nutricionistas, ginecologistas, obstetras, odontólogos, assistentes sociais, etc. enfermeiras responsáveis por atendimentos primários como vacinação, acompanhamento na higiene alimentar, porque distribuímos alimentos, porém não graciosamente, acompanham o peso da criança, crescimento, etc. Já tivemos crianças que foram padrão da Nestlé, bebês lindos e fortes que fotografavam. A Saza Lattes existe há 35 anos. É uma responsabilidade, e acho que ela está inserida incontestavelmente na história da saúde do Paraná.
IZZA – Como você teve a ideia de trocar de atividade, sendo que no outro ramo havia se dado tão bem?
MARIZA — Era um comércio muito dinâmico, mas como já falei, por uma questão de tranqüilidade, quis trocar. Já havia tido muita compensação nessa área, pois até fui condecorada como a “Dama de Disco do Paraná” como sendo do Sul do País a maior revendedora. Encerrei então para descobrir novos caminhos e outras realizações. Só aquilo não me bastava. Eu já havia comprovado a minha capacidade como empresária, pois sou considerada, e me sai bem em todas as lutas com relação à parte empresarial e continuo prestando os meus serviços à comunidade de Curitiba Quis me dedicar a outros caminhos. Sempre desejei fazer algum bem ao povo em geral e me apareceu essa oportunidade de ser indicada pela Sra. Irene Minolli, conheci a sra. Dalila Lacerda que foi e é a presidente de honra da Saza Lattes, e foi quando ela me encaminhou. Estou atualmente em franco desempenho de minhas atividades, batalhando para que a Saza Lattes jamais saia do cenário da saúde. Gosto muito e tenho dado provas de minha perseverança.
IZZA – Qual seria o seu recado para as pessoas que lutam?
MARIZA – Que as dificuldades de cada dia sejam sanadas e que elas não se intimidem, não esmoreçam, porque é um trabalho válido. A cada dia surgem novas dificuldades e a gente vai acumulando forças para resolvê-las à medida que vão aparecendo. Tenho sido feliz com minha diretoria, muito capaz e corajosa, que me capacita também a desenvolver esse trabalho. O mérito não é exclusivamente meu, mas também da diretoria. A vice, Maria Helena Larsen Santos, minha secretária que está a par de tudo; Carlota Farias dos Santos Lima, e das minhas equipes de trabalho; meus diretores que são três, para que os trabalhos sejam mais abrangentes e capacitados; a diretora geral, Dra. Deuse Gustra, a diretora técnica Rute Túlio e um administrativo que nos acompanha desde o começo, Artur Neme, a quem eu devo muito. Espero continuar com essa mesma perseverança e nada vai nos afastar desse trabalho, e que, num futuro bem próximo, quando vencer o meu mandato, entre outra pessoa que tenha o mesmo amor.
IZZA – E o Clube Soroptimista?
MARIZA – Eu tive uma carreira muito bonita no Clube, ocupando vários cargos na diretoria. Estou há oito anos, comecei e logo fui convidada a ser a segunda tesoureira, e me interessei de forma geral, porque é um trabalho muito abrangente. Atendia às solicitações, e colaborei com o programa Jovem Cidadão. Seminários de Jovens, Meio Ambiente. O Clube é muito preocupado e voltado à boa vontade internacional, direitos humanos, melhoria da condição da mulher, desenvolvimento social e econômico, etc. Eu, tentando sempre colaborar, fui me destacando, prestando serviços. O que me surpreendeu, foi ser convidada nesse último congresso pela Idália Flores de Sarça a compartilhar dessa última eleição, na qual fui eleita por unanimidade para secretária da região. É o segundo cargo da América do Sul, no
qual eu terei que me dedicar cada vez mais ao soroptimismo, estudar e estar frente a frente com todo este trabalho que diz muito com a minha personalidade e com meu ideal de servir. “Quem não vive para servir, não serve para viver”.
IZZA – Mariza, fale agora sobre a homenagem prestada a você na última semana.
MARIZA – Quero até dar uma satisfação as minhas amigas, de quem eu recebi flores, telegramas, telefonemas. Foi uma homenagem que o Clube Soroptimista daqui improvisou, programou para me homenagear como vitoriosa na última eleição. Não deixa de ser uma deferência muito especial para o clube daqui ter um elemento capaz de assumir a secretaria da América do Sul, porque é um trabalho muito abrangente e de muita responsabilidade, ligado a órgãos internacionais. O Clube Soroptimista existe e é composto por quatro federações, Soroptimista Internacional das Américas, Soroptimista Internacional da Europa, Soroptimista Internacional da Grã-Bretanha e Soroptimista Internacional do Pacífico.
Consequentemente, eu terei que estar em constante entrosamento com os objetivos desta nossa organização. Com muita satisfação e alegria, o Clube daqui me homenageou por isso. Lá estiveram muitas representantes que muito me honraram. Agradeço por tudo e pela biografia que minha amiga Luizita D’Albuquerque Teixeira ponderou a meu respeito como mulher, mãe, empresária, amiga, soroptimista. Tenho comprometimento público e não tenho o direito de falhar e sim, um compromisso de continuar a fazer o que tenho feito e me aprimorar, e se algum erro cometer não será intencional, talvez somente por omissão ou esquecimento. Estou pronta e de braços abertos para ouvir sempre conselhos ou orientação, e disposta a ouvir, porque meu objetivo maior é servir.
IZZA – Agora, Mariza, gostaríamos de saber do teu “Café”.
MARIZA — Esse café foi uma opção minha também. Eu tinha uma loja de discos ali, especialmente de clássicos e jazz, e resolvi, de minha cadeia de lojas, conservar uma, fazendo daquela mais um meio de continuar convivendo com meus amigos, porque adoro a Boca Maldita. Izza, eu sinto emoção tão grande quando começo a entrar naquela avenida que dizem ser a menor do planeta, porque todos demonstram amizade, desde os engraxates, os vereadores, secretários, todos os segmentos que lá frequentam e que vão também porque gostam de mim. É um meio de conviver constantemente com meus amigos que eu espero jamais deixar de ver.
É um veículo que me põe a par de tudo é a Boca sem Segredo. Lá eu sei das últimas notícias, aprendo, faço meus apelos, minhas comunicações, homenageio minhas amigas quando saem em entrevistas, porque tenho um pequeno local onde destaco as pessoas que fazem algum trabalho social, e nisso sou completamente apolítica. Tenho o prazer de conversar todos os sábados e domingos com o nosso prefeito Requião e com seus assessores, e com outras pessoas que me dão muita satisfação.
IZZA – E como fica a coordenação de tudo isto?
MARIZA — Eu procuro conciliar. Preciso, antes de tudo, ser organizada. Tenho hora pra tudo, o dia certo, e ainda participo socialmente. Creio que jamais faltei a uma reunião do Clube Soroptimista, e participo de todas as promoções. A última foi a construção de uma creche que nos envaidece e nos traz grande satisfação, porque por intermédio da criação dessa creche, cuja construção está sob a direção da Sra. Elisa Chechia de Noronha, realizamos mais um Programa Nosso do Clube Soroptimista. “Mulheres ajudando mulheres”.
Enquanto as mães deixam suas crianças na nossa creche, onde passam o dia, saindo à tarde com o banho tomado e alimentadas, as mães conseguem arranjar também um trabalho para o aumento de sua renda familiar. Tenho programado os meus sábados e domingos para treinamentos de pesca. Agora mesmo participei de uma seletiva e fui classificada em 2° lugar. Vamos em três paranaenses representar o Paraná no Rio de Janeiro de 22 a 31 de julho, e se formos bem classificados participaremos do Mundial na França. É um hobby que me traz muita satisfação. Pescando recobro todas as minhas energias.
IZZA – Fale-nos de você, Mariza, como mulher, todas essas atividades não interferem na sua vida pessoal?
MARIZA — Para que não haja interferência em meu lar, quando saio de uma reunião para outra, eu procuro desligar e me voltar a outro assunto. Quando chego em casa, desligo de tudo. Beijo meu filho, meu marido Homero que é muito complacente comigo e que não tem outras palavras que não sejam para me ajudar e me incentivar. Agradeço inclusive essa benevolência que ele tem comigo, porque eu viajo a serviço, sabe às vezes o dia inteiro e ele me entende e compreende. Sempre procuro almoçar e jantar com minha família, porque eu não posso me considerar vitoriosa ou útil num determinado segmento de minha vida, se não tiver uma felicidade plena em casa.
Me considero extremamente feliz porque aprendi a amar as pessoas como elas realmente são, não como gostaríamos que elas fossem. Mesmo as coisas negativas de minha vida, considero como positivas, porque é uma forma de apender, somar conhecimentos, evitar que voltem a acontecer. Todas as coisas desagradáveis se tornam positivas em minha vida, porque tenho esse poder de transformar, tanto que eu não tive grandes sofrimentos porque sempre levo por esse lado. Homero Lamartine de Farias é a pessoa que me dá maior inspiração, meu marido há dezoito anos, porque me apóia, valoriza, aprecia. É o meu maior fã. Por essas pessoas, meu marido, meus filhos, minhas atividades, vale a vida.