Curitiba, 27 de março de 1988
LEILA é decoradora há quinze anos. Em São Paulo, trabalhou com o engenheiro Sérgio de Camargo Moraes, onde adquiriu grandes conhecimentos sobre o assunto. De volta a Curitiba, começou tudo novamente, com a amiga e também decoradora Vania Schrappe. Acredita no idealismo-ação, idealismo-trabalho, racional e objetivo. Desde 1983 participa do Conselho Permanente da Mulher Executiva da Associação Comercial do Paraná. Nesta conversa, Leila nos dá uma oportunidade de conhecê-la melhor.
IZZA – Leila, quem procura um decorador?
LEILA – Em geral, pessoas que acreditam que todo um bom trabalho é realizado por um profissional especializado no setor, seja porque sentem o respeito que o assunto merece, seja porque já tentaram decorar suas casas e reconheceram que o resultado não foi satisfatório.
IZZA — Você acha que o bom profissional é reconhecido aqui?
LEILA – De um tempo para cá, sim. Felizmente aquela estória de que o elemento de fora é sempre melhor está se extinguindo. Está praticamente acabada a insegurança e a timidez do paranaense, que o impedia de reconhecer e prestigiar os valores locais. Atualmente, temos nomes que se integram aos melhores padrões internacionais, tanto em decoração como em arquitetura. Alguns deles foram pioneiros corajosos, venceram concursos, efetivaram trabalhos fora do Paraná, e com muito esforço e dedicação abriram novos caminhos, para só depois serem reconhecidos aqui
IZZA – O que você prefere, iniciar a decoração partindo do nada, ou aproveitar algo que o cliente já possua?
LEILA – Gosto dos dois igualmente. Se as peças que o cliente possui são boas, ótimo. Mesmo quando um móvel não tem maior expressão, mas traz consigo um grande componente afetivo, embora não seja fácil, sempre á possível encontrar uma maneira de valorizá-lo, seja pela restauração, por um tratamento ou pela colocação apropriada no ambiente, ou pela combinação dessas três soluções.
IZZA – O que é mais importante na elaboração de um projeto?
LEILA – Vários itens são importantes, desde o conhecimento do espaço e as possibilidades que ele oferece, a sintonizar exatamente o que o cliente tem em mente, sem se ater unicamente a essa ideia que nos é trazida, pois, embora o desejo do ciente seja um fator preponderante, é preciso sentir e avaliar muito bem todos os aspectos, para então propor a melhor solução.
IZZA — E o mercado curitibano?
LEILA – Guardadas as devidas proporções, semelhante ao das grandes cidades, com seus pontos positivos e negativos.
IZZA — Defina algo original.
LEILA — Bem, por definição, é criação de algo novo, diferente, inédito. Em decoração, muitas vezes, é utilizar algo já conhecido, porém em situações novas.
IZZA – Como você vê o amador e o profissional?
LEILA – O amador, com reservas. O trabalho do profissional é feito com amplo conhecimento técnico, planejamento e detalhamento de espaço, proporções, viabilidade, adequação, estilo, visão de conjunto, criatividade e senso prático, responsabilidade com o cliente. É o estudar e o pesquisar constantes, características essas que, na maioria dos casos, o amador não possui, pois confunde trabalho com diletantismo.
IZZA – Quais os cursos de decoração que você indicaria?
LEILA – Infelizmente, no Brasil não existe curso superior de Decoração, exceto o inserido no curso de Arquitetura. Há alguns bons no que oferecem, mas ainda assim, incompletos. O curso superior criaria um critério básico de seleção, ou seja, a habilitação dada pela escola, com deveres e direitos estabelecidos.
IZZA – Como você chegou a optar pela decoração?
LEILA – Cheguei a cursar o 1º ano científico (na época era a denominação) para me preparar a prestar vestibular de Arquitetura, pois meu pai, que é engenheiro de grandes estruturas hidroelétricas, portos e aeroportos, me ensinou a ler plantas, mas, por uma série de razões, incluindo a pouca experiência dos meus 17 anos, não fiz Arquitetura e sim Pedagogia. Trabalhei com excepcionais durante o curso, e depois com adolescentes. Casei, fui morar em São Paulo, tive filhos, mas nunca parei de desenhar, fosse em festas de aniversário das crianças, em vitrines de boutiques de amigos, em cenários para festas da escola, até que um engenheiro, Sérgio de Camargo Moraes, que construía casas para venda, olhou por acaso uma perspectiva em vista aérea que eu tinha feito do living do apartamento para o qual nós mudaríamos, e me contratou rapidamente.
Fiquei assustada e feliz com a possibilidade de trabalhar. Logo em seguida, matriculei-me no Spade, porém seis meses depois tive que optar, pois para atender casa, crianças pequenas, mais trabalho e curso, mesmo que eu me organizasse ao máximo, o tempo físico era insuficiente. Optei pelo trabalho, e estudava sozinha em todos os momentos possíveis. Meu marido sempre me apoiou, especialmente quando fui chamada para o primeiro trabalho. Desse, vieram outros, e então abri um escritório em São Paulo. Menos de um ano depois, meu marido foi transferido para Curitiba e comecei tudo de novo aqui, associada a uma grande amiga e excelente decoradora, Vania Schrappe.
IZZA — Como foi seu trabalho com excepcionais?
LEILA — Muito importante, pois são gente como nós, só que limitadas em certos aspectos. São afetivos, gostam de música e de cores alegres, e me ensinaram muito, com a satisfação de poder aprender coisas novas. Sentiam o quanto eu gostava deles, quanto esforço fazíamos juntos para desenvolver tudo o que poderia ser desenvolvido. Foi um tempo muito bom, eu era jovem, mas já tinha prazer em ser útil à comunidade. Fico feliz quando vejo empresas contratando o trabalho que o excepcional tem capacidade para fazer, e ele o faz bem feito.
IZZA — Você acha que ainda há preconceito?
LEILA — Bem menos do que já houve, mas infelizmente ainda há. Creio que, se mais pessoas, das que acreditam que todos temos um espírito, pensassem que o excepcional está só temporariamente impedido de realizar algumas coisas, elas o olhariam com mais respeito e carinho.
IZZA — Você tem multa facilidade de expressão e ainda é idealista. Já pensou em participar da política?
LEILA — Sou idealista sim, mas só acredito em idealismo-ação, idealismo-trabalho, racional e objetivo. O resto é pieguice, pode ser lindo em discurso melodramático, mas não resolve os problemas sociais gravíssimos que temos. Idealismo teórico é necessário, e conhecemos grandes mestres que dedicaram suas vidas a ele. Vamos agora trabalhar para que esse idealismo se concretize. Ah, a política, não tenho capacidade nem gosto dela. Faço a minha parle como cidadã, conscientizando funcionários e prestadores de serviços, trabalhadores dos diversos segmentos que a decoração exige, para um aprimoramento da qualidade de trabalho, produtividade para que se registrem na Prefeitura, registrem auxiliares, que abram e mantenham uma poupança, enfim, que saiam da sombra e cresçam devagar, mas com firmeza.
IZZA — Você faz parte do Conselho da Mulher Executiva da Associação Comercial. Como é esse Conselho?
LEILA — Sim, faço parte desse Conselho desde que ele foi criado, em 1983. É formado por mulheres que trabalham em diversas áreas e é presidido, atualmente, por Margot Bettega Canet é um grupo que, graças a visão do Presidente da ACM, Dr. Carlos Alberto Pereira de Oliveira, atua hoje para o desenvolvimento das mulheres, dando inclusive orientação jurídica a quem dela necessite em termos profissionais. Nós nos reunimos às segundas-feiras, promovendo cursos, palestras com debates, conferências, e hoje temos um membro do conselho, Marina Tanigushi, na diretoria da ACP. Recentemente, foi realizada uma experiência no Banco da Mulher, presidido no Paraná por Lá Engel, com o apoio do Banco Bamerindus, que vale a pena conhecer, é sensacional.
IZZA — Pelo seu entusiasmo, essa experiência merece ser divulgada, não?
LEILA – Merece e precisa. Nós não podemos mais ficar esperando as coisas melhorarem. Cada a cada um de nós ajudar a melhorar as coisas, por menor que seja a colaboração.