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“NÃO PRECISAMOS ENTENDER DE ARTE, BASTA SENTI-LA” comenta Lucia Horst Calluf

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Curitiba, 12 de setembro de 1988

LUCIA HORST CALLUF destaca-se desde 1970 como artista plástica. Com extenso curriculum, Lucia adora o expressionismo. Atualmente doou para o Conselho Municipal da Condição Feminina, o apreciado “Tríptico” que retrata a evolução e a conquista da mulher. Esta é Lucia, Sra. Habib Calluf.

IZZA – Lucia, como andam as artes plásticas?

LUCIA – Estão bem porque há muito estudo, muito interesse, e muita participação, não só da parte dos artistas, mas também do governo e de Instituições. Aqui no Paraná, no ano passado, houve o I Salão da Arte Sacra do Brasil do qual participei. Temos o MAC, Museu de Arte Contemporânea com a atual diretora, professora Maria Cecilia de Araújo Noronha, uma pessoa muito inteligente e culta com grandes conhecimentos na área. Temos o Salão de Alcy Ramalho Filho, com repercussão nacional, que contou com mais de duas mil inscrições.

Eu não poderia deixar de mencionar a Apap – Associação Paranaense de Artistas Plásticos, que se movimentou bastante. Temos também a colaboração do secretário da Cultura, dr. Renê Dotti, que não mede esforços, dando todo o apoio possível para que os artistas tenham condições de mostrar sua arte aqui e em outras cidades, e até mesmo em outros países. No sentido geral, as artes plásticas até pouco tempo atrás, abrangiam uma sociedade elitizante. Por exemplo, Van-Gogh sofreu horrores materiais e espirituais porque não conseguia um resultado financeiro através de suas obras, consequentemente sentia-se frustrado, pensando que seu trabalho nada valia. Atualmente notamos que o artista tem mais oportunidades de mostrar sua arte para um público heterogêneo, sendo mais gratificado financeiramente e também tendo mais compensação em seu trabalho. E ainda mais, sentindo a satisfação de ver suas obras analisadas, criticadas e amadas por todos os segmentos da sociedade.

IZZA – Em tua opinião, quais são os maiores problemas nas artes plásticas do Paraná?

LUCIA – Há falta de união entre os artistas, apesar da Apap se movimentar bastante. Fica difícil pela falta de companheirismo da própria classe, dando margem para que se formem panelas, em detrimento de uma grande maioria.

IZZA – É preocupante este tipo de problema?

LUCIA – Claro, pois eu faço parte deste contexto como artista plástica e como uma galerista que já fui. Inclusive eu e minha amiga Janete Burda montamos uma galeria de arte para dar uma oportunidade aos novos, àqueles que muitas vezes são artistas natos e não têm chance de mostrar a sua arte. Posso citar como exemplo Oscar Floriani que realizou sua primeira individual em nossa Galeria, e hoje é um grande artista nacional e internacional, expondo e trabalhando em Paris, onde residiu por algum tempo. Bem, quando montamos foi sensacional, uma época muito movimentada. Fizemos muitas amizades, conhecimento. Tínhamos até um cravista que dava aula. Organizamos também vários cursos de História da Arte e fazíamos lançamentos. Esta fase marcou muito.

IZZA – Esta carreira de artista necessita de uma evolução constante, não?

LUCIA – Claro que sim. Iniciei meus estudos de desenho em 1979 com o professor Alberto Massuda. Logo depois fui para a escola de Arte, Desenho e Pintura com o mestre Luiz Carlos de Andrade Lima. Realizei também curso intensivo com o professor Miguel Lopes Palias, na época presidente da Associação Internacional de Artes Plásticas residente em São Paulo. Participei também de vários intercâmbios com minhas colegas de artes sempre estudando muito e me aprimorando em minha evolução. Felizmente, sempre tive o apoio de minha família, principalmente de meu marido. Me lembro que tive uma fase em que eu pintava de madrugada, levantava sempre às três e meia da manhã porque meus filhos eram pequenos e durante o dia não me sobrava tempo. Sempre tive fascinação pela arte. Dormia pouquíssimo, mas foi o único jeito que arranjei na época e aqui estou.

IZZA – Qual seria a posição da mulher artista plástica em relação a outros Estados e até outros países?

LUCIA – Eu acho que a nossa artista plástica não deve se acanhar, nem se intimidar em relação a artistas de outros lugares. Um exemplo disso é Janete Burda. Em visita a seu filho que mora em Londres, aproveitou a oportunidade, e esteve em Paris visitando alguns Museus e Galerias mostrando sua arte. Por isso foi convidada para uma coletiva que está acontecendo agora e uma individual a seguir.

IZZA – O que significa Arte para você?

LUCIA – E a sensibilidade d’alma que faz com que você possa externar o teu pensamento imaterial – materializando-o através de uma tela. Como já dizia Picasso: “Pintar é libertar-se e isso é essencial

IZZA – Já que estamos falando de mulheres, o que você pensa sobre o avanço o espaço que elas vêm alcançando atualmente?

LUCIA – Claro que antigamente ela era submissa, mais subestimada em seu potencial, inteligência e não podia extravasar, era um absurdo, e ainda contava com o machismo. Esta abertura foi ótima, o perigo são os excessos. Acho que algumas estão exagerando demais, trabalham fora, dentro, se esgotam sem tempo para o marido, para os filhos. Passaram dos limites. Não deve existir o antagonismo nem a vontade de superar o homem, o que deve existir e predominar é o companheirismo, estar do lado do homem porque não há necessidade de estar na frente. O trabalho e atuação da mulher não implica na perda da feminilidade.

A luta pela melhor condição da mulher é uma coisa maravilhosa, ótima para nossos filhos, para os pais, para o mundo porque somos nós que geramos os homens do amanhã; somos as donas do lar, amantes, esposas e principalmente temos uma capacidade infinita. Sou a favor de tudo isso, mas principalmente do equilíbrio que não deve deixar de existir em nenhum momento.

IZZA – Qual seria o seu estilo?

LUCIA – Sou uma artista eclética e parto mais para o expressionismo, pois me identifico mais com este estilo. Ele marca através da veemência da cor. E aquela expressão mais de dentro para fora, através do sentimento. No meu trabalho predomina a cor azul, todos os tons. E minha cor preferida. E dentro do meu estilo, que não é acadêmico e sim mais estilizado, faço somente o que gosto, o que tenho vontade, procurando ser perfeccionista. 

IZZA- E o porque de sua doação para o Conselho Municipal da Condição Feminina?

LUCIA – São três quadros. O primeiro simboliza a mulher quando vivia enclausurada dentro de si, abafando toda sua inteligência, sua criatividade e o seu potencial. O segundo quadro do “Tríptico” mostra a mulher querendo se libertar, ainda medrosa, acanhada e muito preconceituosa, por isso mesmo sofrendo, mais porque começou a perceber e a sentir a sua potencialidade latente, sem poder extravasá-la. O terceiro, mostra a libertação total da mulher através de sua inteligência, criatividade e capacidade em todos os segmentos da sociedade, notando-se o seu destaque no mundo das artes, nos negócios, na educação, na ciência e atualmente na política.

Doei porque achei importante para nós mulheres, porque justamente fala sobre o tema “Mulher”. Esses trabalhos nunca foram expostos porque não os fiz para vender e sim para doação na ocasião oportuna. Como aqui, o nosso Conselho Municipal da Condição Feminina é pioneiro, cuja presidente é nossa amiga Marlene Zanin, eu conversei com ela, mostrei o trabalho e ela achou incrível. Ele veio de encontro aos objetivos. O “Tríptico” está em exposição lá mesmo e eu gostaria que as pessoas fossem olhar porque é uma coisa muito nossa.

IZZA – Sua participação foi contínua desde 1979, em individuais, coletivas etc. Conte-nos o fato que mais a marcou nesta trajetória toda?

LUCIA – Multas coisas me marcaram e foram gratificantes, mas jamais poderei esquecer a minha individual na Andrade Lima Galeria, no ano passado, em novembro. Luiz Carlos pediu-me que convidasse conhecidas e amigas para um bate-papo sobre arte. Foi uma surpresa enorme porque foi sobre mim que ele falou, e partindo dele, uma pessoa que tanto admiro, essa homenagem foi e sempre será inesquecível.

IZZA – Você acha que aqui a arte é devidamente valorizada?

LUCIA – Antes não, mas na atualidade as pessoas já estão curtindo mais em termos, procurando mais. Antes ela era elitista, não é que ela seja uma necessidade material, mas é essencial para o espírito. O que faz bem para os olhos é bom para o espírito. Em termos financeiros, depende do artista, ê claro que se um artista tem nome, ele é procurado e faz seu preço, mas temos também artistas excepcionais, grandes valores que não vendem porque ainda não têm nome. Fora daqui é diferente: uma amiga foi a Paris, procurava a Galeria Debret, não encontrando, entrou e outra e mostrou seus trabalhos e o dono da galeria ficou impressionadíssimo sem se importar com seu nome e seu curriculum.

IZZA – Você não acha que uma grande maioria gosta do que primeiramente agrada à vista?

LUCIA – Claro, acho também que uma grande parte é assim porque você não precisa entender profundamente de arte, basta senti-la. Uma parte mais elitista não sei, porque eles adquirem mais como investimento, não somente porque gostam, mas também porque vale.

IZZA – Vendo o seu curriculum dá para notar que você adora expor?

LUCIA – No começo a gente quer mostrar, depois vêm os convites. Eu participo e badalo muito porque o meio é sensacional. Para o artista isto é muito bom, mas, à parte isto, eu adoro a vida social, reuniões, papos e participar diariamente quando exponho por que só assim sentimos as reações das pessoas que vêem o nosso trabalho, e aqui o público é muito crítico.

IZZA – E, para finalizarmos, o que você gostaria de dizer?

LUCIA – Que toda a pessoa que tem uma ideia, uma vontade, procure se esforçar ao máximo para concretizá-la, porque vale a pena. No mundo competitivo em que nós vivemos, mais do que nunca é exigida toda nossa capacidade. Quero, como mulher, dizer que nós mães, esposas e geradoras dos grandes homens do amanhã não devemos nos acanhar diante de pequenos obstáculos porque temos um enorme potencial para realizarmos coisas admiráveis para este mundo em que vivemos, assim contribuindo para melhorá-lo cada vez mais.

 

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