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“NÃO ME SINTO REALIZADA, MAS GRATIFICADA COMA VIDA” conta Nordélia Gradowski

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Curitiba, 25 de setembro de 1988

NORDÉLIA CASTELLO BRANCO GRADOWSKI, descomplicada, firme em suas opiniões. Há muito, dedica-se com garra e dinamismo a várias causas que fazem
do seu dia-a-dia, uma constante conquista. Simpática, e extremamente segura, diz sentir-se gratificada com a vida e nos conta nesta entrevista como pensa e como desenvolve suas atividades. Está e Nordélia, Sra. Eros Nascimento Gradowski.

IZZA – Nordélia, quais são suas atividades atuais?

NORDÉLIA – Temos que começar numa ascendência daquilo que somos na essência. Eu sou uma mulher bem casada com muitos filhos e alguns netos. Dentro de nossa liberação feminina, eu acho que uma das funções mais importantes que a mulher exerce atualmente, vai ainda é a de cuidar da sua casa. Além disso, eu sou professora, diretora de escola e especialista em educação pré-escolar. Tenho a minha própria escola, que funciona no Jardim Virginia. O nome é Toribitaba, nome guarani que significa; Torib, felicidade e Taba, quer dizer aldeia. “Aldeia Feliz”. Tenho a responsabilidade de 160 crianças mais ou menos, e a satisfação de ser muito bem-conceituada, pois trabalhamos com muita dedicação e carinho. Aquilo que para as crianças é uma brincadeira (aprender brincando) para nós é uma coisa muito séria, porque sabemos a validade e a importância da educação pré-escolar na preparação da criança para enfrentar a vida escolar. Bem, atualmente sou também Presidente do Clube Soroptimista de Curitiba, e sou tesoureira da Omec Organização Mundial de Ensino Pré-Escolar que é um membro da ONU, faz parte da UNICEF, e até dois meses atrás, eu era diretora do Departamento de Educação pré-escolar do Sindicato de Escolas Particulares durante duas gestões. Na OMEC, eu só não fui presidente, já fui vice, tesoureira etc. No Clube Soroptimista também já atuei em vários cargos, de tesoureira, vice-presidente e tesoureira regional da América do Sul, que é responsável pelas finanças de oito países da América do Sul. Atualmente na parte regional, sou a coordenadora de relações públicas e, na parte de Clube, sou a presidente.

IZZA – Comecemos então pela sua escola.

NORDÉLIA – Existe há dez anos, embora eu já trabalhasse com pré-escolar há 15 anos. Antes eu era sócia de um outro jardim e infância, eu e uma amiga. Então resolvi seguir a minha linha pedagógica na qual acredito, por isso saí da sociedade e abri outra com minhas duas filhas, que agora seguiram outros caminhos: uma trabalha num departamento pedagógico da Copel, a outra é advogada e cartorária. Fiquei sozinha na escola, sozinha é modo de dizer, porque estou muito bem acompanhada por professoras ótimas, uma coordenadora muito boa, que estão há muito comigo. Acho que isso que faz com que minha escola seja produtiva porque estas pessoas estão ligadas ao que fazem, trabalham pela camisa, nosso quadro é estável.

IZZA – Você sempre trabalhou?

NORDÉLIA – Não enquanto meus filhos eram pequenos. Esperei o último dos seis entrar no primeiro ano, dai, achei que poderia fazer o que sempre gostei. Fiz uma especialização para me reciclar, na Faculdade Católica e recomecei. Antes a minha presença dentro de casa era imprescindível, agora que cada um já escolheu seu próprio caminho, eu posso me dar ao luxo de querer educar outras crianças, filhas e outras mulheres que precisam trabalhar, desenvolver sua vida, muitas das quais, graças a Deus, hoje em dia, já reconhecem o valor da educação e necessidade da educação pré-escolar. O jardim de infância deixou de ser o lugar onde a mãe larga a criança para poder se ver livre e se dedicar a algum curso, trabalho, etc. A pré-escola é uma necessidade, um embasamento para um bom desenvolvimento. Minha clientela deveria ser de dois a seis anos, mas eu tenho tido crianças menores, principalmente irmãos de alunos que já estão aqui. Estas mães preferem deixar aqui porque, às vezes, não podem dispor de verba para deixar em algum outro lugar mais dispendioso. Nós recebemos também crianças menores, no sentido de ajudar as mães que já são nossas.

IZZA – E o Clube Soroptimista? Como você arranja tempo?

NORDÉLIA – Sou a atual presidente, substituindo a Luizita Albuquerque Teixeira. Toma bastante tempo, mas pessoas bem ocupadas, quanto mais coisas tiverem para fazer, melhor dividem seu tempo. Meu sogro sempre diz uma coisa muito interessante. Se você precisar de algo, peça para uma pessoa ocupada porque a desocupada não vai arranjar tempo para fazer. Quem está acostumada a fazer muito ao mesmo tempo, talvez não faça tão perfeitamente tanto quanto a que tem mais tempo, mas certamente fará. Sei que com muitas atividades, a família sai prejudicada, porque o tempo que eu teria para ficar com eles, é menor, mas é muito gratificante. Lastimamos que o Clube Soroptimista aqui no Paraná seja ainda pouco conhecido, porque trabalhamos muito. E um clube de serviço classificado para mulheres profissionais aos moldes de Lions ou Rotary, porém somente feminino. Não feminista. Reúne profissionais de todas as áreas, no intuito de melhorar a qualidade de vida da comunidade, dando enfoque principal às mulheres. Temos programas enormes em várias áreas. Trabalhamos no campo da saúde, da educação, do tendimento com os povos, direitos, melhoria da situação da mulher.

Temos prêmios muito importantes, concurso Jovem Cidadão que se desenvolve no 2ª grau para descobrir novas lideranças, e o concurso de treinamento para reciclar mulheres de mais de trinta anos. Aquelas que deixaram de trabalhar por qualquer motivo e que ao voltar, se sentem defasadas e precisem se atualizar. Este prêmio é dado para que ela tenha condições para adquirir o que falta. É um trabalho muito bonito, que a maioria das pessoas não conhece, e algumas até acham que é um clube de estas, uma vez que as pessoas são destacadas digo, as frequentadoras, resultando então o surgimento destes nomes e não do que estavam fazendo lá, seja num almoço, jantar ou outra festividade. Em nossos almoços e jantares, sempre há uma conferência interessante para qual convidamos pessoas de nossa comunidade. Os limites de nosso clube são os limites da cidade de Curitiba. É muito bom mesmo darmos certo destaque às pessoas de nossa comunidade. Elas sempre servem de exemplo e o exemplo é ainda hoje a maior escola. Uma pessoa com força, criativa, bom caráter, bem delineada é a melhor escola para colocar diante de nós mulheres e diante dos jovens que vêm atrás de nós.

IZZA – Um fato interessante é a gama do Clube Soroptimista Internacional, isto é, a vontade com que vocês lutam?

NORDÉLIA – Eu sempre brinco que o Clube é feito de apaixonados porque as pessoas que não se identificam com os objetivos, acabam não ficando. Temos muitas sócias que entram, ficam por um determinado tempo e saem, principalmente, as que pensam que entram para fazer benemerência, por exemplo, encontram um outro panorama porque não um clube benemérito nem beneficente; é um clube de serviço, e as mulheres que estão lá já atingiram um certo “plateaux” em sua profissão. Em reconhecimento a isso, a terem tido condições num mundo tão difícil como o nosso, de atingirem esse tipo de qualidade profissional, elas se acham de alguma forma na obrigação de retribuir, e como isso poderia ser feito? Trabalhando para a comunidade e dando chance para que outras mulheres também tenham condições de atingir, dentro de sua área de profissão, um status que as gratifique profissionalmente. Sempre temos em vista o nosso objetivo maior que é a melhoria da comunidade e do cidadão em si.

IZZA – A que você atribui o surgimento frequente do Clubes, Associações, Conselhos, etc.?

NORDÉLIA – Acho que isso é um reflexo do progresso, da necessidade que as pessoas têm de se agrupar para melhor produzir, porque o ser humano é antes de mais nada um ser social: ele não sobrevive sozinho, depende basicamente do meio ambiente para sobre- vivência. Outro ponto, é o sinal dos tempos: a mulher vem lutando por um posicionamento mais independente, mais ativo e de uns tempos para cá ela está conseguindo. Quanto mais mulheres e homens se unirem, mais esperanças teremos de que este mundo em que vivemos, melhore.

IZZA – E o caso do protesto quanto à propaganda do motel?

NORDÉLIA – É muito bom podermos falar sobre isso, porque as notícias que saem pela imprensa nem sempre são bem exatas. Nós não fizemos uma campanha contra um motel como disseram, em absoluto. Veja bem, numa sociedade moderna como a de hoje, quem poderia ser contra um motel? Hoje em dia é um estabelecimento comercial igual a uma farmácia, uma padaria ou um supermercado, faz parte do cotidiano de nossa comunidade. Então seria uma tolice enorme dizermos que fizemos campanha contra um motel. Primeiramente não foi isso; em segundo lugar, não foi uma campanha, não sabemos inclusive como essa publicidade apareceu tão depressa, porque o que nós na realidade fizemos na reunião em que nos encontramos, (sete ou oito entidades femininas para fazermos o lançamento de uma campanha de Meio Ambiente) foram comentários sobre esse tipo de propaganda, de publicidade que não citava nome de motel, e que nós não poderíamos absolutamente concordar com a forma como foi dirigida.

O que nós levantamos foi um protesto quanto à forma como esta campanha foi dirigida ao público. Veja bem, uma publicidade está sempre sugerindo um comportamento. Se aparece uma pessoa bebendo um refrigerante, o que sugere? Faça como eu, tome esse refrigerante. Na propaganda de uma camisa? Faça como eu, use uma camisa, e marca tal etc. Uma mulher casada num motel, com outra pessoa que não seja seu marido? Nos estarreceu porque achamos que é uma sugestão. Uma propaganda sempre leva direta ou indiretamente a um convite para que você faça aquilo que ela está sugerindo. Uma grande parte de mulheres não concordou com isso, e nem poderia concordar. Contra o nosso protesto, contestaram, que a imoralidade está na cabeça das pessoas que liam os outdoors. Nós não concordamos porque a moralidade estava bem explícita no bilhete que a mulher deixou para o marido porque ali não há nenhuma dúvida, ela está indo ao motel com outra pessoa. A estudante está dizendo para seu namorado que vai estudar com a turma e na verdade está indo com outro. A adolescente (o anúncio de rádio sugere a voz de uma adolescente) que está dizendo para mãe que vai dormir na casa da Aninha, quando está claro que ela está indo a um motel com seu amor.

O que nós não podemos concordar, é que uma propaganda tenha como objetivo principal sugerir adultério e mentira. Se eles disseram querer atingir determinada clientela que tinham em mente, nós estamos protestando em nome de outra clientela que não age assim quando dizem que essas são as desculpas normais usadas para frequentar um Motel. Estão querendo dizer que esse é um comportamento social aceitável e comum, atualmente, de caráter. Então como vamos nós e, quando digo nós, me refiro a todas essas mulheres que não concordaram, como concordaríamos com uma distorção de caráter e com uma ação social que para nós é sumamente reprovável? Se esse tipo de propaganda fosse feito para vender pão, ou remédios ou um tipo de camisa ou de calça, o nosso protesto seria o mesmo. Não é um protesto em razão do tipo de estabelecimento comercial e sim em relação ao comportamento que está sendo colocado como normal. Mulher casada traindo o marido, indo para um motel com outro companheiro, enquanto seu marido fica cuidando dos filhos, não é para nós um comportamento certo nem aceitável. Eu acredito que, para uma grande parte de nossa comunidade, não é também.

IZZA- Muitas pessoas dizem não entender o “porquê” do protesto.

NORDÉLIA – Eu tenho toda a certeza de que essas pessoas não gostariam e receber um bilhete assim de sua esposa nem de suas filhas. Esta é a maior prova e que não é normal. Claro que existem muitas Malus, muitas Pattis que têm esse tipo de procedimento e não temos o direito de criticar, nem de atirar pedras porque mesmo Cristo defendeu a adúltera e disse “O que não tiver defeitos que atire a primeira pedra”. Agora Cristo não colocou a adúltera como exemplo de bom comportamento e de bons costumes. Para nós esse tipo de coisa é ainda uma agressão à sociedade e à família; vivemos em um estado democrático e como eles têm o direito de fazerem a propaganda, nós temos o direito de não estarmos de acordo.

Falo em nome de várias entidades, e vamos continuar protestando cada vez que surgirem propaganda que agridam a família o que levem a uma ideia de inexistência de bons costumes. Vamos continuar a ser cúmplices no bom sentido, com a moralidade e principalmente em defesa da agregação da família, porque na hora em que a família brasileira estiver desagregada, procedendo conforme comportamento sugerido por uma propaganda como está, aceitando isso normalmente como atitude correta, a família desaparecerá. Não sei ainda o que vamos ter que aceitar neste mundo de hoje.

IZZA – Você acha que em centros maiores, este protesto aconteceria?

NORDÉLIA – Em qualquer centro, tenho certeza, que existem mulheres que viriam a se insurgir quanto a esta ideia de generalização de atitudes atípicas sociais, ainda não aceitas como normais. O que acontece é que a vida em cidades maiores é tão agitada corrida e sacrificada que, às vezes, um protesto não chega a ser ouvido, e nós aqui como uma comunidade menor, uma pequena grande província
ainda temos chance de fazermos alguma coisa.

IZZA – Este protesto não auxiliou na propaganda?

NORDÉLIA – Não fizemos a menor força para que o assunto fosse para os jornais ou para a televisão. Não sei como essa união de opiniões de protesto transpirou. Realmente acho que ajudamos, mas com a certeza de que estávamos protestando. Isso já passou, mas continuamos protestando quando necessário.

IZZA – Agora falemos de você.

NORDÉLIA – Sou agitada, procuro fazer da melhor forma possível tudo o que me proponho a fazer e acredito que sou uma mulher satisfeita com a vida. Tenho uma família grande e gratificante, 4 netos lindos, como toda avó coruja. Divido o meu tempo entre eles e os meus afazeres, minhas obrigações fora de casa e acredito que não tenho muita coisa mais a pedir da vida, Deus foi muito bom e me fez alcançar plataforma que eu talvez nem tivesse em mente. Foi uma vida de trabalho e dedicação que fez com que tudo isso fosse acontecendo normalmente. Me considero feliz, não realizada porque acho que sempre queremos alguma coisa a mais e no dia que não almejarmos mais nada, nesse dia morremos. Não só plenamente realizada, mas gratificada, tanto no âmbito pessoal, profissional e nas associações de que tenho tomado parte.

 

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