Curitiba, 28 de fevereiro de 1988
ROSANA GUIMARÃES VILLELA aprecia o trabalho, porque acha que com ele, a mulher se torna independente, psicológica e financeiramente. Executiva de destaque, participa, com seu marido Ernesto Villela, da parte administrativa do De Villela, Scavollo, Pão Real, Bambinella e do Palumbo. Nesta conversa informal, vamos saber um pouquinho de sua vida.
IZZA – Rosana, como executiva, qual é a sua função?
ROSANA — Sou diretora executiva da De Villela. Eu e meu marido Ernesto somos sócios, inclusive na parte administrativa do De Villela, Scavollo, Pão Real, Bambinella e brevemente um novo restaurante, que provavelmente será inaugurado até 15 de março.
IZZA – Como foi o início de tudo isto?
ROSANA – Começamos depois de casados. Meu marido é engenheiro, tem uma construtora. Tínhamos a Bambinella aqui, começamos a fazer chocolates e montamos a De Villela. Meu pai nos vendeu então a Pão Real. Acho que na vida precisamos ter uma oportunidade, e aproveitá-la. Expandir, isto é o que vale. Se existe vento a favor quando a gente sabe para onde vai, um rumo definido, aí fica fácil. Trabalhamos em sintonia, eu posso até errar, mas a gente conversa.
Não brigamos por atitudes, pois tenho o respaldo dele, assim como ele tem o meu. Ele é diretor executivo do setor dele e eu do meu. Nós nos organizamos desta forma, não há problemas. Somos uma empresa pequena. O que ele faz está feito, e o que eu faço também. Troçamos muitas idéias, conversamos, mas não interferimos um com o outro. No fim do dia unimos as metades. Eu não trabalho sem a parte dele, nem ele sem a minha. A minha é a administrativa, de tudo, pessoal, produção, a parte humana; a parte do Ernesto é a de manutenção física e a parte financeira.
IZZA – O que você acha de o casal trabalhar junto?
ROSANA — Acho ótimo quando há respeito, complementação e é isso que temos. Nós nos complementamos. Eu o respeito como uma pessoa competente e ele me vê da mesma forma. Produzimos de igual para igual.
IZZA – Como fica conciliar isto tudo?
ROSANA – E corrido, mas eu adoro trabalhar. Pela manhã trabalho mais com o telefone. Às vezes dou uma passadinha rápida na fábrica. Não tenho horário definido. Dou as coordenadas em casa, atendo os meus quatro filhos, Ernesto de dez anos, Mariana de nove, Bernardo de sete e Bruno de quatro. E quando eles vão à escola, venho trabalhar, e aí não tenho hora para voltar. Às vezes, fico até às 19 ou 20 horas. Felizmente eles são bem independentes, talvez por eu ser assim. Não abro mão do meu trabalho. Mas consigo dividir tudo, até consigo tirar férias. Delego poderes, tenho vários braços direitos, pois não poderia trabalhar sozinha. Cada um tem um setor. Acho que quando a gente quer resolver problemas, delega-se a um só, e quando não se quer, mandamos muitas pessoas encontrarem a solução.
IZZA – Quantas lojas existem atualmente?
ROSANA — Temos quatro lojas, e também em vários aeroportos do Brasil. A nossa meta são d nica e exclusivamente lojas, aeroportos e exportação. O nosso chocolate já existe há oito anos. Comecei na Bambinella, porque observei que, nas capitais maiores, vendiam chocolates caseiros em confeitarias e padarias. Assim, contratei uma pessoa especializada e comecei a lazer. Achei interessante porque Curitiba não adotava este sistema na época. Atualmente, o meu chocolate é chic, artesanal, de bom gosto. O nosso objetivo é mostrar como é simpático presentear chocolate, e não muito dispendioso, porque tentamos atingir a rotatividade. As embalagens são feitas de tule, filó, papel crepom, decoradas à mão, bem europeias.
IZZA — Você acha que a crise afetou o teu ramo?
ROSANA – Sim, embora nas datas principais não: Natal, Páscoa, etc. Afetou no dia-a-dia. Sinto isso até com as pessoas de maior poder aquisitivo. Sei que não é um produto de primeira necessidade, mas vendo muito bem. A fábrica é enorme, as embalagens são idealizadas por mim, com muito carinho. Viajo, pesquiso fora do Brasil, onde existem coisas maravilhosas. Infelizmente, ainda nos faltam recursos, matéria-prima.
IZZA – Quais são as tuas perspectivas para este ano?
ROSANA – Acho que este vai ser o ano do capitalismo. Quem tiver dinheiro vai fazer dinheiro, e quem tiver coisas imobilizadas vai estacionar na expectativa. Sinto que hoje em dia ninguém compra nada despreocupadamente, tudo é pensado e repensado. Acabou a época em que as pessoas eram arrojadas. Penso que a preocupação é geral.
IZZA – Você acha que o teu ramo oferece vantagens por não depender de época e de modismo?
ROSANA — Sim, por exemplo, com as panificadoras. Os artigos de primeira necessidade, pão, leite, café, queijo, etc., sofrem menos. Podemos deixar de comprar uma roupa, um sapato, uma bolsa, mas não uma refeição adequada. Quanto ao chocolate, é outra coisa. Sei, por exemplo, que se uma pessoa dispõe de uma certa quantia na bolsa para fazer compras, primeiro comprará os artigos de primeira necessidade, depois o chocolate, embora no sul se consuma bastante, pela origem do povo, pelo clima.
Aqui o pessoal é exigente, tem bom gosto, por isto há uma constante necessidade de aprimoramento e inovações. Constantemente lançamos novos sabores, mais requintados, definidos, para isso temos um químico excelente que trabalha conosco. O nosso chocolate ainda não tem a textura do suíço, por uma questão de matéria-prima. O suíço é feito com produtos do mundo todo, com alto teor de gordura, o que lhe fornece aquela maciez e textura. O nosso já não é tanto. Usamos o cacau brasileiro. Vários chocolates do mundo são importa- dos e exportados. Não é o caso do Brasil, que somente exporta.
IZZA — Estando você diariamente com coisas deliciosas â sua frente, você come muito chocolate?
ROSANA – A degustadora da fábrica sou eu, e eventualmente experimento um ou outro para manter a qualidade. Estamos sempre atentos. Procuramos primar pela eficiência e bom gosto. A pessoa compra com os olhos e recompra pela qualidade.
IZZA – Você acha o curitibano muito exigente?
ROSANA — Acho que sim, e penso que a cada dia está aprendendo mais. A pessoa paga caro, mas exige. A apresentação, logicamente, é importante, mas a qualidade muito mais. Gostam muito de inovações, novas criações, novos sabores. Nossa linha é enorme. Trabalhamos com produtos brasileiros, que pretendemos lançar a nível e exportação.
IZZA – É difícil exportar?
ROSANA – Para exportação, o problema maior é que eles não primam pela apresentação. Querem saber primeiro o preço, e depois a qualidade do produto. O preço é o primeiro fator de aceitação. E difícil entrar no exterior. Como tudo, o circuito é fechado, mas estamos tentando por enquanto com pequenos contatos.
IZZA – Conte-nos sobre os restaurantes.
ROSANA — Estamos fazendo um restaurante internacional. Grelhados, massas, saladas, a nível empresarial, executivo, requintado, de bom gosto. Está ficando lindo. “Palumbo” será inaugurado brevemente. Sobre o Scavollo, 6 um restaurante que atinge gente de todas as idades, acessível a todos, gostoso, badalado. Esta proposta foi bem aceita, e está indo muito bem. A casa é linda e acho que o
Scavollo já faz parte da cidade.
IZZA — Eu tenho notado que, tanto nas lojas como em outros empreendimentos, vocês seguem a linha européia, não é?
ROSANA — Sim. A gente se preocupa com o europeu, mais requintado. Aí incluo estilo europeu, germânico, austríaco, nórdico.
IZZA — Você é organizada? Acredita na realização pessoal completa?
ROSANA — Sim, tudo é uma questão de organização. O meu melhor auxiliar é o lápis. Programa tudo e executo uma coisa de cada vez. Acho que ninguém se realiza plenamente na vida, porque na hora em que se alcança um objetivo, já se tem outro. Uma coisa que me ajuda muito é que, quando não atinjo alguma coisa primordial, ou quando os objetivos não são compensadores como eu gostaria que fossem, não me deprimo, nem me abalo; tiro proveito, procuro repassar o que não deu certo, aproveitar um objetivo que naufragou.
IZZA – E o teu relacionamento patroa-empregada?
ROSANA — Estimulamos muito o nosso pessoal. Espero que procurem fazer do trabalho que executam uma coisa boa para eles. A alegria impulsiona e quanto trabalham satisfeitos, naquilo que a gente escolheu, por necessidade ou não, as coisas vão melhor.
IZZA – O que você pensa sobre a mulher que trabalha?
ROSANA — Acho que o trabalho gera uma emancipação, crescimento. Hoje tudo é uma luta, para ser mulher, para se impor, para si mesma, e na vida existe uma hora para isto, se bem que eu acredito que nunca é tarde demais, mas às vezes, mais tarde se toma mais difícil, as pessoas já são mais exigentes, e isto deprime, constrange, dificulta e inibe. A mulher deve ter uma cabeça pensante, atuante, sem concorrer com o marido. Os dois devem ser unidos mesmo batalhando em campos distintos para a realização dos dois. Em alguns casos, as mulheres pagam um preço para conseguirem seu espaço.
Acho estranho que a mulher que trabalha (algumas, é claro), use o dinheiro exclusivamente para si. Acho que isto provoca até uma reação no casamento. Que emancipação engraçada! Se os dois trabalham. Participam, por que não dividem? Então seria “o que é meu, é meu; o que é teu. É nosso”? Outro ponto: ser o homem da casa. Isto nunca vai acontecer, por- que o homem é “o Homem da casa” por uma condição física, fisiológica, e vai continuar sendo sempre. A mulher tem que ser inteligente, se emancipar sendo valorizada. Respeitada, feminina, com toda as regalias de mulher. As atitudes rígidas, às vezes adotadas por elas. Só as desmerecem. Com inteligência, ela consegue tudo o que quer. Porque a gente se manifesta por atos, pensamentos.