Curitiba, 21 de Abril de 1991
LETÍCIA MARIA DI BERNARDI; Sagitariana, de muita sensibilidade, muito tem contribuído para as Artes, inovando, criando, promovendo e coordenando exposições. Personal e de firme opinião, Letícia nos conta nesta conversa o que acontece em sua Casabrannka e o que pensa sobre as artes e os artistas.
Izza – Há quanto tempo existe a Casabrannka Galeria de Arte?
Letícia – Eu inaugurei em 1979 uma loja de objetos de decoração, pratas, cristais e cerâmicas e junto com esta loja, coloquei algumas obras de arte por estar ligada ao assunto (fiz Belas Artes). Com apoio de meu irmão Edson Di Bernardi que na época tinha galeria em São Paulo, resolvi terminar com os objetos e partir só para a arte em si. Meu relacionamento com os artistas sempre foi bom desde a época de escola e isso facilitou bastante, e me possibilitou entrar numa área da qual eu gostava. E depois, a minha intenção era realmente ter uma atividade fora de casa. Diversos fatores contribuíram para que eu abrisse a Casabrannka e aqui estamos.
lzza – Qual foi o primeiro artista que expôs na Casabrannka?
Letícia – Em 79 eu fiz uma individual com um artista paulistano, Luiz Carlos Ferrattioli. Depois fizemos muitas outras inclusive a promoção da primeira individual de Lélia de Oliveira. Partimos dentro de um trabalho profissional dentro da arte. Exposições com Susana Vilella, e só.
lzza – Quando um artista alcança o mercado de artes?
Letícia – Quando ele começa a fazer exposições profissionais através de galerias. Até então ele é considerado como artista amador. Desde a hora em que ele obtém o aval de uma galeria começa a ser profissional.
lzza – É difícil montar uma exposição?
Letícia – Existe todo um esquema para que tudo dê certo. A penetração com o pessoal da imprensa tem que ser muito boa, com artistas, órgãos de cultura e além de tudo a nossa sensibilidade é importantíssima. Saber escolher artistas de bom nível.
lzza – O que é uma obra de arte?
Letícia – É um trabalho de artesanato que passa a ser uma obra de arte a partir do momento que tenha um valor intrínseco. Uma estátua é um objeto decorativo, mas uma escultura de um objeto de arte, traz o valor dentro de si mesmo. O tempo pode passar mas ela não perderá o seu valor.
lzza – O que é mais comum no procedimento do público ao comprar uma obra de arte?
Letícia – Mesmo que a pessoa tenha grande cabedal de conhecimentos sobre o assunto, sinto que os compradores preferem o que emociona, o que dá prazer. Dificilmente o público consumidor se detém simplesmente à qualidade. Claro que ele busca a qualidade mas a obra tem que dizer alguma coisa. Se você compra um quadro, vai conviver com ele diariamente dentro de sua casa, por isso ele terá que ser agradável ·a vista e condizer com a sua sensibilidade.
lzza – A escolha do gênero não é condizente com o estilo de vida de cada local?
Letícia – Pode ser. Aqui em Curitiba as pessoas preferem comprar o que é mais compreensível, que tenha uma linguagem mais fácil. Nos locais onde haja liberdade, mar, como Rio ou Florianópolis etc, onde consequentemente as pessoas têm a cabeça mais aberta, talvez prefiram cores mais vibrantes, abstrato etc. A escolha do quadro vai muito da sensibilidade, personalidade e do estilo de vida de cada um.
lzza – Na Casabrannka são aceitos todos os tipos de trabalhos ou você segue uma determinada linha?
Letícia – Qualquer tendência é bem aceita desde que primeiramente entre a minha empatia. Cada galeria tem um gosto de acordo com a sensibilidade da dirigente, pois cada uma tem um público, trabalha com determinados artistas. Depois da sensibilidade há muitas coisas que você tem que considerar como o valor da obra, a técnica, o suporte, o material usado, a artista.
lzza – E quanto ao teu acervo?
Letícia – É importante termos artistas de bom nível, um cuidado muito grande para a seleção. De repente, fizemos exposição com Erico da Silva, Alvaro Borges, Wilson Andrade e Silva, Domício Pedroso, artistas de mais de trinta anos de profissionalismo. Se eu mantenho suas obras em acervo, eu não vou poder colocar junto uma pessoa que está principiando e que não esteja no nível. Isso não quer dizer que não vamos dar espaço para os novos.
Izza – De que forma então os novos terão o seu espaço?
Letícia – O espaço será dado a partir do momento que ele seja um bom artista profissional e que trabalhe bem, e isso ele só conseguirá com o trabalho contínuo e dedicação diária senão, nunca chegará lá. Para este artista jovem ter o nosso aval, teremos que confiar em seu trabalho. Existe uma pré-seleção.
Izza – O que é necessário para trabalhar bem um acervo?
Letícia – Comunicação direta com colecionadores e clientes. Se você de repente precisar de um presente, as pessoas vão saber onde procurar.
Izza – Quem compra mais, o homem ou a mulher? Letícia: Eu acredito que mais o homem. Quando a mulher vai escolher sempre deixa uma brecha para que o marido veja se gosta. Muitas vezes levamos a obra até a casa do cliente para que ele veja se o quadro realmente está de acordo com o ambiente. Se você vê um quadro na galeria é uma coisa, mas se vê em tua casa, no teu ambiente, o efeito é outro.
Izza – Quantas individuais você promove por ano?
Letícia – Faço uma individual no primeiro semestre e outra no segundo semestre: Isso me dá um espaço para uma eventualidade, encaixar alguma outra coisa interessante que seja importante apresentar. Uma exposição individual é muito trabalhosa e de muita responsabilidade. Eu prefiro fazer menos, mais escolhido e bem feito. Dou muita atenção ao acervo.
lzza – Você sente-se realizada com a Casabrannka?
Letícia – Sinto-me bastante realizada e veja, nós atravessamos uma fase difícil não só para os que trabalham com arte mas para todo o mercado, devido a situação político e sócio-econômica do Brasil, mas acredito que isso é passageiro porque já podemos ver uma luz no fim do túnel. Mas, enfim gosto tanto disso que não pretendo deixar de trabalhar, e já estou com muitos planos.
lzza – Quais seriam estes planos?
Letícia – Vou levar para Santa Catarina artistas daqui e trazer de fora artistas para cá. De repente o nosso mercado pode estar saturado e assim as novidades serão apresentadas. Para isso estou tendo o apoio cultural do Banco do Brasil de Santa Catarina, particularmente o de Joinville o que prova que as pessoas continuam acreditando nas artes. Vou fazer uma exposição em maio com James Cristian, artista novo que atualmente mora lá e está vendendo superbem o seu trabalho. Hoje ele mora na praia, pinta marinas etc. De repente entra aquela história da qual falamos sobre o local e a influência que ele exerce nas artes.
lzza – Para esta exposição você recebeu ajuda?
Letícia – Com o apoio da associação arranjamos um lugar para expor. Vamos fazer a montagem etc. Tenho o apoio da Marina Medeiros Mosemann (da Galeria Lascaux) atualmente diretora do Museu de Arte de Joinville, além disso a associação atlética do Banco do Brasil também vai nos dar apoio monetário para que a gente possa fazer a exposição. É a única galeria que existe em Joinville e Marina como dona da galeria está nos dando o maior apoio, conseguiu a listagem etc. Nós vamos trocar favores e espero que a classe empresarial também apoie.
lzza – Porque Casabrannka?
Letícia – Em cima do nome existe todo um esquema cabalístico, e foi o nome que eu sonoramente gostei. Foi sugerido por minha mãe e aprovado pela cabala. Não tenho logotipo pra minha marca e a forma de escrever.
lzza – Você vem de uma família de artistas, não é?
Letícia – Meu irmão E. Di Bernardi se lançou no mercado e vai indo muito bem, com projeção. Minha irmã Edna é escultora. A outra também pinta e eu esporadicamente pinto, mas por enquanto, sem nenhuma pretensão.
lzza – O que foi e é mais gratificante no teu ramo?
Letícia – O que acho maravilhoso e que já falei em outras entrevistas é o convívio com os artistas. São pessoas como nós, com problemas, doenças, tristezas, alegrias, que dividem conosco todo aquele mundo interior que tem, de arte, prazer e beleza. Também o contato com o público é fascinante porque sempre estão surgindo novas pessoas que se atualizam e que procuram crescer como a gente. Além de tudo isso, o mais fantástico é fazermos aquilo que gostamos.
Izza – Você não acha que em Curitiba é fácil lidar com arte?
Letícia – O curitibano curte, participa e nos dá muito apoio. É fácil o contato com o público curitibano desde que o artista tenha o respaldo de alguém que tenha credibilidade. Aí entra o papel do marchand, o nosso trabalho.
lzza – Você aconselharia alguém a investir em obras de arte?
Letícia – Não é um investimento que você faça hoje, para ganhar amanhã. A arte requer paciência. E melhor do que o investimento em dinheiro ou em dólar, desde que você acerte aquele artista que posteriormente será valorizado por orientação ou por intuição.
lzza – Depois da aprovação das últimas medidas governamentais, você não acha que ‘o mercado foi aquecido?
Letícia – Eu acho que sim, justamente por este trabalho que estou tentando fazer e do qual falei anteriormente. O aquecimento aconteceu de março para cá, se bem que não se pode contar com meses de férias etc, o mercado é meio inconstante.
lzza – Aqui em Curitiba as pessoas costumam presentear com obras de arte?
Letícia – Sim e este trabalho se deve ao marchand que tem que estar constantemente em contato com os fregueses.
lzza – E os teus filhos também se dedicam ao campo das artes?
Letícia – Tenho dois filhos, Karla, de 27 anos, fonoaudióloga e o meu filho de 19 anos que trabalha na Forum no Shopping Mueller, nenhum deles mostrou interesse pelas artes apesar de me darem muito apoio.
lzza – Quais seriam teus planos?
Letícia – Continuar no mercado, levando adiante os meus projetos. Este ano faremos duas exposições individuais de dois artistas novos.