Curitiba, 17 de março de 1990
MARIA ANITA SANTOS; há muito convive com a moda. Constantemente em evidência por sua competência, atualmente dirige a sua confecção Nino Veci presente nas vitrines de todo o Brasil. Anita é criativa e prática e hoje nos conta o porque de seu sucesso. Esta é Anita, Sra. Walmor Santos.
lzza – Sobre moda, o que você vem fazendo?
Anita – Desde que eu parei de atuar no Magazin Avenida eu pedi a licença de uma marca. São duas malharias que desenvolvem os modelos que eu crio, mando fazer e vendo. Para esta linha de malharia tenho vários representantes no Brasil todo. Foi a minha primeira investida em moda feminina, porque por muitos anos, preferi trabalhar com moda masculina que sempre foi a minha especialidade. Antes de vir para Curitiba, eu morava em São Paulo e sempre trabalhei com moda masculina. Claro que é muito gostoso ter o meu próprio negócio, com autonomia para criar, decidir, fazer. Estou adorando.
lzza – Qual é o gênero desta confecção?
Anita – No masculino é uma malharia elaborada, Chic, atual em questão de cores, etc. No feminino é a malharia para a mulher que trabalha, aquela roupa superprática. Optei por esta linha porque o mercado está repleto de gente que faz roupa de festa em malharia e de repente, eu não gostaria de competir com elas. E além do mais, a roupa prática me atrai demais é necessária porque hoje, a maioria das mulheres trabalha e tem que estar bem vestida, é a vontade dentro de uma praticidade marcante.
lzza – Como é a situação dos compradores na época atual?
Anita – Se a BTNF continuar assim, só terá vantagens quem conseguir comprar à vista, pois do contrário, a mercadoria sairá bem mais cara. Para pagar no ato, o cliente tem que ter um capital de giro enorme. Agora, neste clima de posse do Collor, parece que o Brasil fez uma pausa. Todos estão esperando para ver como é que fica a situação. Hoje, se a confecção é distante, no ato da trans-portadora apanhar a caixa, alguém já está pagando juros mais três ou quatro dias até chegar ao destino, imagine como é que fica … Como eu falei, o capital de giro deve ser enorme e o comerciante tem que ser rápido, não deixar a mercadoria parada nas prateleiras. Lembro que, antigamente, as coisas eram bem mais fáceis. Comprávamos para ganhar em até 45 ou 60 dias e tínhamos tempo suficiente para vender.
Izza – Qual é sua opinião sobre este comércio agressivo de peles que está acontecendo no exterior?
Anita – Eu pessoalmente, acho que está chegando a extremos. Se a pele está numa loja para vender é porque alguém matou o animal. A culpa não é de quem compra. Se pensarmos assim, radicalmente, teremos que andar descalços, sem bolsas e principalmente, nos tornaremos vegetarianos. De onde vem os calçados, a carne que comemos, etc.? Também matam os animais e aves para que nos alimentemos.
lzza – Neste ano as vendas diminuíram?
Anita – O problema é geral. Quem comprou, comprou menos do que nos outros anos e muitos deixaram para comprar depois. O calor continua e acho que o inverno vai longe.
lzza – E os preços?
Anita – Impraticáveis, principalmente quando comparados ao salário mínimo. É aquela velha estória: todos falam da confecção e do lojista, dizem que ganham muito, mas a realidade é outra. Se procurarmos a origem de tudo chegaremos a conclusão que dois ou três monopólios controlam tudo. Então, todo o fio tem a mesma procedência, a tinturaria toda tem a mesma procedência e assim por diante, e dali eles vão repassando os preços, até chegar ao consumidor final – é uma bola de neve. Principalmente na fibra sintética, o monopólio é forte e por isso, os preços acabam sendo altíssimos.
lzza – Como é que você faz para se manter atualizada?
Anita – Constantemente estou pesquisando e frequentando Feiras de Moda. Acho importantíssimo. Participar é oneroso e dá trabalho mas é a maneira certa de nos atualizarmos e divulgarmos o nosso trabalho, pois nos dá retorno. Como diz o Fernando de Barros da editora Abril: ”A moda é tão engraçada que está sempre caindo de moda, ela é tão ligeira que temos que correr para acompanhar”.
lzza – Por que você optou por confecção?
Anita – Eu gosto muito disso. Aprecio mais a fábrica porque ela é mais criativa. Na loja recebemos a mercadoria pronta, e na fábrica temos condições de criar. Para fabricar, partimos do nada, fazemos aquilo que se imagina. Para quem gosta do trabalho de criação, é bem mais empolgante. Os fabricantes grandes aqui no Brasil não investem no criador de moda e geralmente são eles que criam as coleções. Na maioria das indústrias brasileiras é o dono da casa quem faz a moda, e faz o feijão com arroz porque sabe que terá facilidade em vender. Eles não procuram arrojar a moda, por isso é difícil encontrarmos um produto diferenciado; parece que todos trabalham em cima de certas tendências. Se você gostar de alguma coisa mais audaciosa, diferente, terá que procurar bastante até encontrar.
Izza – É fácil fazer moda para o consumidor curitibano?
Anita – O homem curitibano adora vestir novidades. Muitas pessoas acham que ele é extremamente clássico, mas na realidade não é. O homem é mais arrojado do que a mulher, se decide vestir uma calça de um tecido e o blazer de outro ele veste e às vezes fica muito bem. É gostoso fazer moda para o homem curitibano. Quanto à mulher, ela segue muito os ditames da moda, geralmente se baseando muito nas informações da máquina. Claro que temos aqui mulheres super elegantes e que se vestem maravilhosamente bem. Algumas ainda não criaram uma personalidade própria de usar somente o que lhe fica bem. A faixa mais jovem, se veste para agradar a si mesma e somente o que lhe fica bem, independente da moda.
lzza – Você é vaidosa?
Anita – Por incrível que pareça, não sou. Sou extremamente prática. Adoro andar de jeans e camiseta. Claro que gosto de me olhar no espelho de vez cm quando. Só me arrumo quando vou a alguma festa. Gosto de me sentir bem e confortável, porque me movimento o tempo todo. Até em matéria de cabelo, não aprecio muito arrumado e sim mais natural, sem aquele aspecto de recém-penteada. Não cultivo em mim a vaidade excessiva, porque existem coisas muito mais importantes.
lzza – Em sua opinião, o que é importante para uma pessoa estar sempre elegante?
Anita – A naturalidade é muito importante. De nada adianta vestirmos uma roupa bonita, caríssima e ficarmos armadas como um cabide, formais. Quando eu estava no departamento masculino sempre dizia aos vendedores que, quando um cliente viesse comprar uma roupa, teria que escolher e levar uma que não pesasse, pois do contrário, ele não sairia satisfeito. A pessoa tem que se identificar, sentir-se bem com determinada roupa para ter naturalidade. A roupa deve se incorporar à personalidade. Outro ponto importante é sabermos a hora certa para usarmos determinadas peças. Por exemplo, pela manhã, para irmos a um banco não é necessário muita produção. A roupa certa na hora certa. Quando a festa requer um passeio completo, isso não quer dizer um longo sofisticado. Enfim, a mulher deve estar vestida como se não estivesse. Ela tem que estar à vontade, segura, poder ir a qualquer lugar com a certeza de estar bem. A partir do momento em que a pessoa fica ligada no que está vestindo, perde a naturalidade. Outro ponto importante: os excessos são prejudiciais.
lzza – O que representa sua atividade profissional para você?
Anita – Comecei a trabalhar cedo em São Paulo e estou acostumada com esse ritmo. O trabalho sempre foi importantíssimo para mim e acredito que, para muitas mulheres, ele é essencial. A mulher que trabalha tem uma atualização constante, é uma mulher contemporânea, está mais preparada para conversar com o marido, com os filhos, com o mundo. Não tem aquele problema do homem evoluir e ela ficar parada no tempo. Veja, Pequenas Empresas Grandes Negócios, mulheres fazendo coisas, inclusive dentro de casa, agitando e crescendo. Temos em Curitiba mulheres que são exemplo de dinamismo.
lzza – Você não acha que esta garra e a vontade de trabalhar tem relação com o exemplo vindo do lar em que crescemos?
Anita – Quando eu era pequena, num momento difícil de nossas vidas, minha mãe trabalhava o tempo todo, inclusive dentro de casa. Talvez por isso eu tenha começado tão cedo. O exemplo impulsiona.
lzza – E as homenagens, qual lhe marcou mais?
Anita – A homenagem que mais me emocionou foi a publicacão na Revista Playboy, de minhas criações. Em três coleções, vi a minha moda masculina cm malharia na re¬vista, com uma produção incrível. Isso realmente foi uma homenagem maravilhosa! Quando abri a revista e vi, não saberia te explicar o que senti, uma emoção indescritível. É ótimo porque é uma avaliação daquilo que você fez por uma pessoa que tem know-how para avaliar. É o nosso trabalho reconhecido, o retorno da nossa dedicação. Sou contra homenagens pagas. Eu pergunto: qual seria sua satisfação pessoal em ver ou receber uma homenagem que você mesma pagou para que acontecesse?