Curitiba, 17 de maio de 2018
Querida Curitiba.
Nascido junto a Igreja do Bom Jesus, dei meus primeiros passos nas três praças de minha vida: Rui Barbosa, Tiradentes e Dezenove de Dezembro.
Curitibano do coração da cidade foi por uma bondade do destino que presidi a sessão de Diplomação dos eleitos no ultimo pleito, os últimos gestores da vida publica nesta capital, no fim do ultimo século exatamente no dia 17 de dezembro de 1996. Lá no Teatro Guaíra em cujas obras brinquei na infância e onde na juventude ouvi Carlos Lacerda e Leonel Brizola agitarem os espíritos no auge de suas existências.
Aqui tive a oportunidade de servir a Justiça Eleitoral do meu Estado no momento sublime de seu aperfeiçoamento tecnológico sob o comando dos eminentes Desembargadores Luiz Perroti e Wilson Rebach. O nome de ambos jamais será esquecido pelos cronistas e historiadores por terem informatizado as eleições das nossas maiores cidades e presidido a primeira delas com o novo sistema.
Em todos os momentos vivemos a História!
Viviam e amavam na Capital da província, somando cinco mil almas, em 1886, nas aproximadamente duzentas e oitenta casas, entre as ruas que, então tinham nomes diferentes, alguns não mais lembrados: Rua das Flores (depois XV de Novembro), Praça da Matriz (hoje Tiradentes), Rua do Fogo (São Francisco), Rua da Entrada (Emiliano Perneta), Rua do Comercio (hoje Marechal Deodoro), Rua Fechada (hoje José Bonifácio), Rua Direita (Treze de Maio), Rua do Carioca (Riachuelo) e assim por diante.
Sem praias, Curitiba poderia ter sido relegada à condição de simples local de passagem, para os que demandavam ao sul do país.
Assim como o menino nascido na década de quarenta jamais sonhou com esse momento, creio que os habitantes da sonolenta Nossa Senhora da Luz dos Pinhais de Curitiba “arremedo de cidade”, como disse alguém, jamais sonharam em ser sua urbe, um dia, modelo para o universo urbano.
A visão genial de seus dirigentes no século XX, capitaneados por Jaime Lerner, compreendeu que o Urbanismo não se reduz a uma questão de alojamento e de circulação. A cidade foi enfocada como uma micro sociedade que comanda toda a vida das pessoas. O crescimento demográfico passou a ser considerado paralelamente a mecanismos econômicos articulados principalmente com a indústria, com a multiplicação dos postos de trabalho no setor terciário com a procura de superior nível de vida, com as tradições históricas e o respeito da memória.
As massas despossuídas buscaram sempre a “desproletarização”, sem distrações ideológicas e encontraram receptividade em suas ansiedades.
O arquiteto Xavier Arsene Henry, no ano de 1969 ficou surpreso ao constatar no país em que o anarquista Proudhon gritara “A propriedade é o roubo”, que o sonho da grande maioria dos franceses era o de se tornar proprietário de uma casa individual.
Diferente não é o sonho dos curitibanos, cidadãos de comportamento solidário.
Nossas elites democráticas, nessa época em que se costuma atribuir todos os fracassos às elites tão fundamentais que são ao sistema de convivência livre, não ignoram o problema da falta de moradia e suas terríveis consequências.
A Democracia continua a ser um meio de governar como disse Raymond Aron. E depende da eficácia e da habilidade de seus dirigentes, sob pena de se tornar uma “mediocracia”.
O sociólogo Alain Touraine, de quem o Presidente Fernando Henrique Cardoso é reconhecido discípulo, mostrou não conhecer a nossa cidade ao sugerir a seu ex-aluno que a situação insatisfatória no Brasil deve ser atribuída a uma razão básica: a debilidade do Estado.
Melhor teria dito o ilustre professor, que os problemas se agravam, principalmente pela falta de visão estratégica dos homens públicos.
O Prefeito Rafael Greca em sua anterior gestão, este sonhador com os pés no chão, crítico do despotismo burocrático e idealizador de boas ideias, deu ao seu sucessor uma receita muito pessoal, que deixaria o teorizador Alain Touraine perplexo. Ouça as crianças sobre a cidade!
A passos largos, abandonamos um século que não deu ouvidos às crianças, no qual dois fatores, acima de quaisquer outros, moldaram a história humana.
O desenvolvimento das ciências naturais e da tecnologia foi a mais bem-sucedida realização de nosso tempo.
Grandes tormentas ideológicas alteraram a vida de praticamente todos os seres humanos, instalando tiranias totalitárias, tanto de esquerda como de direita e possibilitando explosões de nacionalismos, de racismo, e de fanatismo religioso.
O filosofo Isaiah Berlin refere-se ao século XX como o mais terrível da História com seus massacres e guerras, duas delas mundiais.
Sem qualquer pretensão de fazer futurologia não nos é difícil prever os problemas que enfrentaremos nesse século.
O presente é filho do passado, e pai do futuro, conclusão simples que dispensa aprofundamentos teóricos e crenças apocalípticas.
Os germes dos problemas do futuro já estão estampados nos meios de comunicação que lemos diariamente: violência urbana, terrorismo internacional, separatismos, racismo, conflitos religiosos, movimentos de excluídos, corrupção, invasões, doenças dizimantes etc.
Curitiba, seguramente continuará à margem dos grandes infortúnios da Raça Humana e manterá suas estatísticas minimizadas no tocante a eles.
Sua trajetória luminosa continuará graças à sabedoria de seus governantes, à força criadora de seus habitantes e a beleza atrativa de seus parques, ruas e praças. Que esta jovem Noiva da Razão e do Bom Senso que não ignora a Utopia da Felicidade Universal, seja sempre conduzida para as luzes desse milênio com a consciência e a esperança dos homens de bem que a habitam.
Salve Curitiba! Recanto amigo das nacionalidades, cidade símbolo da tolerância humana!
Felicidades a todos!