Curitiba, 02 de setembro de 1990.
Escrever uma carta para Curitiba. Teria que ser uma declaração de amor. Mas nunca poderia ser piegas. Afinal, minha relação com esta cidade começou na Barão,
onde eu observava o movimento dos bondes.
Minha aproximação com a cidade ia acontecendo e eu já decidira ser arquiteto.
Fui aprendendo a cidade, suas ruas, seus caminhos, passagens, praças, árvores.
Percebi seu desenho escondido buscando desnudar seus mistérios. Hoje conheço Curitiba
como a mim mesmo e nunca me canso de reconhecê-la mais e mais.
Curitiba é a cidade que conseguiu estabelecer o sentimento da solidariedade.
Aqui todos convivem mesclados, pouco importando a região onde moram.
Seguimos a vereda da igualdade e estamos conquistando um conceito importante de vida.
A Curitiba dos anos 90 pode orgulhar-se de ser “Capital Ecológica” do país.
É uma cidade que preservou com atenção seus fundos de vale, calçou suas ruas para pedestres, enquanto as outras davam prioridade aos automóveis. Criou bosques, parques, implantou creches, escolas, postos de saúde, cuidou de sua memória, lançou uma cidade industrial gerando empregos e com tudo isso proporcionando uma melhoria de vida a seus habitantes.
Chegamos hoje no patamar da parceria, em que toda comunidade se preocupa com a questão da cidade, cooperando unida para a resolução de seus problemas.
Através das parcerias viabilizamos programas como o vale creche, o de habitação popular, programas de anti-pó, manilhas e iluminação pública.
A construção de um Jardim Botânico para a cidade e tantas outras idéias que já estão ou estarão entrando em atividade nesta gestão. O próprio programa do “Lixo que não é Lixo”
nada mais é que uma parceria entre a população e a administração municipal, todos
colaborando para diminuir o impacto sobre o meio ambiente do lixo produzido na cidade.
Apenas com a separação do papel velho Curitiba hoje economiza a derrubada de quase mil
árvores por dia. Poucas cidades no mundo podem proclamar índices como este.
Tanto é que nos próximos meses, Curitiba será sede de alguns eventos internacionais,
importantes na área do meio ambiente.
Um deles será a Conferência Mundial do Meio Ambiente, maior acontecimento ecológico
deste fim de século, assim como o seminário “Projeto, Produto e Meio Ambiente” que
contará com a presença de autoridades brasileiras e italianas no primeiro encontro, que
discutirá ao mesmo tempo, a questão da embalagem e de sua reciclagem.
Somos até candidatos, em setembro, a uma espécie de “Oscar” do meio ambiente, a ser
concedido pelas Nações Unidas, por causa exatamente do nosso programa
de separação e da compra do lixo doméstico.
A sociedade do futuro – A sociedade reciclada – vai acontecer em Curitiba
antes que qualquer outra. Aqui estamos prontos para enfrentar o terceiro milênio com o sistema de transportes, adequado tanto do ponto de vista ecológico – é menos poluente e mais silencioso – com eficiência e rapidez – o bonde.
O bonde moderno vai voltar a trafegar pelas ruas de Curitiba como aconteceu na minha infância, mas sem saudosismo com ele. Agora, lançaremos a semente da
“vanguarda” que sempre fomos. Curitiba, com a dedicação de sua gente e a cumplicidade de seus caminhos.
“Para quem vai em busca do sol é sempre madrugada”.
JAIME LERNER
Prefeito de Curitiba
Arquiteto e Urbanista
Planejador de Cidades