Curitiba 21 de Abril de 1990
ANNA MARIA PRINCE CÔMODO: Curitibana, discípula de Traple, Voiski, Turim e Guido Viaro, dedica-se à pintura desde 1951; Ganhadora de vários prêmios, Anna agora dedica-se à colagem. Nesta conversa, ela nos conta sobre sua técnica e o porque de seu sucesso. Confiram.
Izza – Por que colagem?
Anna – Ah, já cultivava isso dentro de mim, pois sempre gostei muito de fotografia e sempre guardei tudo que chamava atenção nas revistas. Cheguei a acumular tantas, a ponto de precisar guardá-las em baú, mas nem sabia o que iria fazer com elas. Experimentei fazer colagem e deu certo. Fui para São Paulo para contatar com artistas plásticos que fizessem o mesmo tipo de trabalho; apreciaram o meu e isso me animou a continuar e comecei a entrar em salões, coletivas, individuais, inclusive na Galeria Contemporânea e segui para Blumenau. Expus na Universidade, ganhei depois vários prêmios no Salão do Santa Mônica, menção honrosa no Concórdia, no Sírio Libanês e muitos outros. Pinto há muito tempo, fiz a 1ª turma da Belas Artes do Paraná. Quando saí da Escola, fui premiada no Salão do Concórdia e ganhei medalhas de bronze. Continuei a pintar até casar quando me mandei para o Rio de Janeiro. Lá, fiz tapeçaria, cerâmica, etc. Estou a todo vapor há quatro anos me reciclei com a Suzana Lobo no Museu Guido Viaro. Recomecei com garra.
Izza – Qual seria o primeiro passo para a colagem?
Anna – Geralmente vejo uma figura ou sucata da Mídia, alguma coisa que eu goste e que me chame a atenção;dali, desenvolvo um tema e saio em busca de algum resultado. Eu faço as colagens rasgadas, não uso tesoura e busco certos grafismo, às vezes uso papel oleoso.
Izza – As pessoas aceitam bem a colagem?
Anna – Aqui em Curitiba as pessoas gostam muito, mas são poucos os artistas que continuam fazendo. A maioria já experimentou e deixou. Há pouco tempo atrás artistas alemãs expuseram no Museu de Arte Contemporânea, somente colagens. Foi uma exposição lindíssima. Esta técnica é muito apreciada nos Estados Unidos, na Europa e, inclusive, em São Paulo. Quanto às minhas exposições, tenho tido bastante receptividade e sinto que a colagem está despontando aqui em Curitiba.
Izza – Qual é a sensação de um artista quando realiza exposição? E como você encara a crítica?
Anna – Dá uma incrível ansiedade porque a gente vai expor e se expor. É um produto muito nosso que todos vão ver. Cada um tem um modo de agir; eu gosto de tudo que faço porque ponho toda a minha dedicação em meu trabalho e, de repente a gente fica na expectativa. É como se fosse um filho. Quando à crítica, acho a válida e ajuda muito pois temos que procurar sempre melhorar. É necessário equilíbrio nas críticas que alguém externa. Eu aprecio e respeito essa opinião. A crítica acrescenta e nos dá oportunidade de aprimorar mais e mais. Aqui em Curitiba são poucos e os que escrevem e fazem críticas, mas acho que são extremamente capazes e responsáveis. Eu os respeito muito.
Izza – Como nasce no artista a escolha de determinado tipo de trabalho?
Anna – Para mim não existe propriamente uma definição, pois eu pinto a óleo também; mas agora estou me dedicando à colagem. O que temos que escolher é a linha, vanguarda ou acadêmica, etc. Hoje, eu faço colagem porque gosto mais, e de repente, posso fazer outra coisa, dependendo do momento. O que me interessa agora é ir sempre mais a fundo e me especializar, não posso dizer que vou fazer o mesmo a vida toda, porque à medida que a gente vai se especializando podem surgir novas idéias e mudanças.
Izza – Isso acontece com a maioria dos artistas?
Anna – Quase todos tem uma linha. Alguns pintam acrílico a vida inteira, mas fazem gravura paralelamente, e assim por diante. O artista nunca se limita a um tipo só de trabalho.
lzza – O trabalho de um artista tem de ser diário?
Anna – Eu trabalho sempre à noite. De dia cuido de minhas coisas e quando anoitece e tudo está mais tranqüilo, eu me volto para a colagem e vou até de madrugada ou até onde houver inspiração. Uma vez por semana contato com o grupo de Susana. É ótimo, porque assim mantemos aquele elo. Quando começo um quadro gosto de terminá-lo, senão perco o ritmo. Todos os dias faço alguma coisa. Para esta exposição o ritmo foi intenso para terminar todos os quadros.
Izza – Qual a é sua preferência no tocante a cores?
Anna – Eu, geralmente, uso cores fortes, tenho que senti-las. O meu trabalho é mais alegre, mais solto. Nunca conseguiria fazer dois quadros iguais, pois devido a técnica que uso, os fragmentos de papel não podem ser idênticos. Uso bastante ó amarelo, que é cabeça, luz, tira o baixo astral. Talvez por isso eu sinta tanta receptividade nos jovens e crianças. Acho que consigo me comunicar otimamente com eles, através da vibração das cores que utilizo.
Izza – A pintura para você é um hobby ou um meio de vida?
Anna – Estou me profissionalizando. Ter a pintura como um meio de vida é muito difícil porque o retorno não é grande a não ser que a pessoa já tenha um passado glorioso no ramo. Aqui há muitos que vivem da pintura. Pode ser que no futuro eu possa. É uma carreira difícil, exige muito da pessoa e, além disso, a concorrência é grande.
Izza – Em sua opinião muitas pessoas que se rotulam artistas deixam muito a desejar?
Anna – Acho que algumas galerias promovem certos artistas porque o material é mais vendável e incorrem no erro de apoiar espaço para quem não tem preparo suficiente. Penso que elas talvez não aceitem muito a vanguarda, falo de Curitiba, porque acham que é difícil vender. Percebo um certo preconceito para com o papel ainda. Fora daqui não há problema; não sei explicar esse fato. No entanto, não poderia ser uma questão de durabilidade, pois o papel que eu trabalho dura tanto quanto o óleo porque tem PVA, o que toma super durável, até com a aquarela existe este preconceito e no entanto é um trabalho lindíssimo, que deveria ser mais respeitado.
lzza – Como compradora, quais as obras de sua preferência?
Anna – Carlos Vergara, Gabriel Senize e muitos, que vi agora na Bienal. São lindos! Também compraria telas de vários outros artistas paranaenses, que são sensacionais. Temos muitos pintores excelentes que, cada vez mais, conquistam seu espaço, com as mais variadas técnicas.
Izza – Por que a maioria dos artistas nunca se sente totalmente realizada?
Anna – Acho que é porque a gente quer produzir cada vez mais; não existe o “eu estou realizado”, assim como dificilmente uma pessoa é plenamente feliz. É uma pena que muitos só tivessem sucesso depois de mortos. Acho importantíssima a realização pessoal, termos um resultado que nos gratifique, o que já é um grande passo para a realização profissional.
Izza – Que mensagem você teria para os novatos?
Anna – Para que alguém tenha sucesso, é indispensável muito trabalho, muita auto-disciplina, procurar ler e conhecer para poder melhor fazer as coisas. Os horizontes devem estar sempre abertos, para maior receptividade. Enfim, levar a sério. O importante é a cabeça.